Ministro do STJ nega pedido de reintegração de ex-membro da Comissão de Anistia

Ministro do STJ nega pedido de reintegração de ex-membro da Comissão de Anistia

O ministro do Superior Tribunal de Justiça Mauro Campbell Marques

Sandra Fado/STJ

O ministro Superior Tribunal de Justiça (STJ) Mauro Campbell Marques negou um pedido de reintegração de Victor Neiva, ex-membro da Comissão de Anistia, ao posto de comissionado do colegiado. O pedido, em caráter liminar, ou seja, urgente, foi realizado por Neiva no dia 16 de dezembro.

A interpelação foi negada pelo ministro, que entendeu não haver "periculum in mora" no caso. Isto é, o magistrado não viu risco em relação tema se a liminar não fosse concedida de imediato.

O ministro do STJ entendeu ainda que o caso exige uma análise mais aprofundada. Mauro Campbell Marques pediu informações à ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, e uma manifestação do Ministério Público Federal.

Com a negativa da liminar, a primeira seção do STJ, colegiado formado por 10 ministros especializados na área de direito público, irá julgar o mérito do caso. A decisão, contudo, deverá ficar para depois do recesso.

Entenda o trabalho da Comissão

A comissão trata de reparações por perseguição política durante a ditadura militar (1964-1985) e é subordinada ao ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH), liderado por Damares, que exonerou Victor em outubro deste ano.

À época único representante dos anistiados no órgão, Victor Neiva afirma, no pedido ao STJ, que o comprometimento do governo com a ditadura militar pode “contaminar” o trabalho feito pelo colegiado e legitimar a “ocultação da verdade” sobre o período.

“Ao permitir o comprometimento da representação dos anistiados através do seu direcionamento e escolha pelo Executivo e não por membros da sociedade civil, ainda mais por um executivo declaradamente comprometido com o desfazimento do pacto, há a contaminação de todo o trabalho do órgão que tenha causado prejuízo a requerentes, legitimando a ocultação da verdade que possivelmente é a finalidade mais visceral do órgão”, diz Neiva no documento.

Victor Neiva afirma ainda que a Comissão de Anistia do Governo Federal dá ao país uma oportunidade de pacificação em relação ao tema, e que a existência do colegiado já comprova que houve violações de direitos humanos no período militar.

“A adoção de uma justiça de transição é uma oportunidade clássica e privilegiada de uma nação passar a limpo seu passado e mirar o seu futuro. Sua simples existência já significa o reconhecimento de que algo fora do normal aconteceu, que é necessário fazer uma análise mais profunda para se elaborar um diagnóstico mais preciso das razões do ocorrido, como evitá-lo e que rumo tomar doravante. É através dela que se obtém a verdade e a paz necessária para seguir adiante", enfatiza o advogado no documento.

Histórico

Em junho, a Comissão da Anistia tomou a primeira decisão que incomodou Victor Neiva. Ficou acertado que não deveriam mais ser registrados os valores das indenizações concedidas nos resultados dos julgamentos do colegiado publicados no “Diário Oficial”.

Na ocasião, Victor Neiva disse que a decisão era um “retrocesso monumental”, já que sem os valores não há o admissão do Estado do valor que deve ser pago como indenização.

A partir desse embate com a cúpula do colegiado, o clima para a permanência do advogado na comissão foi piorando.

Em setembro, o blog revelou que o MDH criou uma nova regra que acabou retirando o advogado de seu cargo. Parecer assinado pelo presidente da Comissão de Anistia, Alexandre Magno Fernandes Moreira, determinou que nenhum membro do colegiado poderia atuar em processos na Justiça relacionado ao tema de anistia.

Victor Neiva tem uma carreira de mais de 20 anos como defensor de anistiados, atuando em casos como o do cartunista Ziraldo, perseguido pela ditadura. Ao entrar no colegiado, ele abriu mão de atuar em processos que tivessem ligação com sua atuação na Justiça para, assim, evitar eventuais conflitos de interesse.

“Ora, não se pode falar em democracia participativa plena se, quando legitimamente exercida para fiscalizar os atos da Administração e denunciar suas ilegalidades, é substituída por ato arbitrário da própria autoridade fiscalizada”, afirma Neiva no pedido ao STJ de reintegração na comissão.